segunda-feira, março 09, 2009

Midbrain Mutiny: The Picoeconomics and Neuroeconomics of Disordered Gambling
Don Ross, Carla Sharp, Rudy E. Vuchinich e David Spurrett


     A Picoeconomia, ou análise dos padrões de consumo, é definida pelos autores deste livro como a «modelação das escolhas intertemporais num mercado sub-pessoal [subpersonal] onde o equilíbrio entre os diferentes interesses é atingido através da negociação». Dito assim, parece a definição da economia de mercado, mas é apenas mais uma teoria que vai recuperar o famigerado homo æconomics. A investigação integra-se na corrente da Neuroeconomia, com apoio de investigação laboratorial por recurso a técnicas de imageologia.
     Segundo uma recensão publicada pela revista JASSS (ler —>), o livro enumera os "métodos que os humanos adoptam para auto-controlo e para evitar uma gama de escolhas excessiva de soluções de curto prazo: as regras pessoais de comportamento auto-impostas são aquelas em que os autores se focam mais extensivamente, e são de facto as estratégias nas quais, ao longo do livro, se baseia o conceito de que o comportamento é um equilíbrio entre jogos de negociação entre interesses sub-pessoais".
     Segundo a recensão da MIT Press (ler —>), "o livro descreve a dependência patológica [addiction] como uma disfunção crónica do equilíbrio entre o sistema dopamínico do cérebro médio [midbrain] e o sistema serotogénico frontal e pré-frontal, e revê recente evidência de investigações sobre a eficácia de drogas anti-dependência. Os autores argumentam que a melhor maneira de compreender a dependência patológica do jogo [gambling] é utilizando um modelo um modelo híbrido picoeconómico-neuroeconómico".

quarta-feira, março 04, 2009

Neuroeconomics and Public Management

Revising the Fundamentals: Insights of Neuroeconomics for Economic Foundations of Performance-Related Pay in Public Management
Utz Helmuth
Transformations in Business & Economics - Vol. 8, No 1(16), 2009

Utz HelmuthABSTRACT. This paper concentrates on recent findings in the upcoming field of neuroeconomics where researchers use new neuroscientific methods to analyze economic behavior. It focuses on the question what public management research can learn from neuroeconomics to improve performance-related pay systems. Among those findings covered are intertemporal choices, fairness concerns and altruistic punishment. The results concerning social behavior are contrasting the neoclassical theory-based recommendations of public choice theory as competition among bureaucracies and performance-related salary. This paper proposes to integrate these findings in the public management theory and to revise established performance-related pay schemes and contracts. Furthermore, it discusses possible problems which could arise with this new approach.

O Mercado das Percepções
A economia comportamental (behavioral economics) explica porque é que protelamos, compramos, pedimos emprestado e surripiamos chocolate sob os impulsos do momento.
«The Marketplace of Perceptions» - artigo na Harvard Magazine

sexta-feira, outubro 24, 2008

Colin F. Camerer"When Does "Economic Man" Dominate Social Behavior?"
Colin F. Camerer e Ernst Fehr
«O modelo canónico da Economia considera que as pessoas agem de modo racional e em busca da satisfação pessoal. Existe, contudo, muita evidência que contraria esta visão, colocando a questão de saber quando é que o "Homem Económico" domina o resultado das interacções sociais, e quando é que dominam a racionalidade limitada ou outras preferências. Neste artigo mostramos que os incentivos estratégicos constituem a chave para a resposta a esta questão. Uma minoria de indivíduos "egoistas" [self-regarding] pode gerar um comportamento agregado "não-cooperativo" se o seu comportamento gerar incentivos para que a maioria dos outros indivíduos "altruistas" [other-regarding] imite o comportamento da minoria. Do mesmo modo, uma minoria de indivíduos "altruistas" pode gerar um resultado "cooperativo" se o seu comportamento gerar incentivos para que a maioria de indivíduos "egoístas" aja cooperativamente. Também em jogos estratégicos, o comportamento agregado pode situar-se mais afastado ou mais próximo de um "equilíbrio de Nash", conforme os jogadores com elevado grau de pensamento estratégico imitem ou apaguem os efeitos de outros que tenham muito pouco pensamento estratégico. Teorias recentemente desenvolvidas sobre comportamentos altruístas e racionalidade limitada permitem explicar estas descobertas e proporcionam melhores previsões do comportamento agregado do que as que são obtidas pela teoria económica tradicional.»

Nova Fronteira

"A Nova Fronteira da Neuroeconomia", artigo de Mauro Maldonato, publicado na revista Scientific American Brasil:
«O estudo sistemático dos fundamentos biológicos dos comportamentos e dos processos ativados nas escolhas econômicas já definiu um novo âmbito de pesquisa transdisciplinar – a neuroeconomia – que se tornou ponto de confluência de estudos de neurociências, economia e psicologia e se candidata como alternativa à visão neoclássica da economia, segundo a qual o Homo oeconomicus age dentro dos vínculos de uma racionalidade perfeita, que pode ser formalizada e tende à maximização da utilidade esperada.»

terça-feira, novembro 06, 2007

This Wheel's On Fire


      X-Phi - Alina Simone

     Muito bem, vamos lá ver se percebemos porque é que o hino da Filosofia Experimental apresenta uma cadeira de braços a ser devorada pelas chamas... hum... depois da 1ª Revolução da Filosofia — que recorria à análise da estrutura oculta das palavras que usamos — e da 2ª Revolução da Filosofia — que optou por observar a superfície da linguagem, o modo como a usamos no dia a dia — chegou a 3ª Revolução da Filosofia, a Filosofia Experimental, que recorre à ajuda de outras ciências, experimentais, para resolver o problema de saber como a mente funciona. Ou seja: o significado lingúistico depende de estruturas ocultas da mente, as quais só podem ser reveladas através desta nova abordagem das Ciências Cognitivas, recorrendo à Linguística, à Psicologia, a modelos computacionais, à Neurociência Cognitiva, à Antropologia e outros domínios experimentais. Conclui-se, portanto, que os filósofos que pensavam que podiam fazer o seu trabalho sentadinhos numa cadeira de braços estavam muito enganados. Que arda a cadeira!
     Isto, que nos é explicado aqui por Jesse Prinz, é muito interessante, mas é especificamente sobre "como a mente funciona", e não sobre Filosofia. Tal como diz um comentador: Quais são os "problemas" ? Quais são as "questões" ? Eu compreendo que, sendo a linguagem o veículo do (nosso) conhecimento, interessa saber como funciona esse veículo, e nesse caso a Neurociência experimental pode dar uma ajuda. Mas é esse o programa da Filosofia? Não me parece.
     OK, venha lá então a Filosofia Experimental e que se lixe a cadeira de braços. A partir de agora passamos a conversar em pé, embora continuemos no mesmo sítio. E o que é que irá arder a seguir: os sapatos?



Descobri estes videos e links no Natural Rationality
E, já que estamos no domínio da música e do fogo, aqui fica "This Wheel's On Fire", Julie Driscol & Brian Auger dando vida própria a uma canção de Bob Dylan. Era nos anos 60, época em que qualquer coisa pegava fogo com facilidade, se a memória não me falha.

quarta-feira, outubro 31, 2007

Metáforas, metáforas, metáforas.

     Temos de considerar que classificações ou conceitos, tais como 'racional' e 'emocional', são construções mentais que classificam, e dividem, uma realidade que não funciona dessa maneira seccionada, como se existissem dois circuitos paralelos. Investigações como a de António Damásio mostram a desadequação dessa divisão, embora ele próprio, para dar a conhecer as suas propostas, tenha de recorrer a esses conceitos.
     Não consigo explicar isto muito bem, mas encontrei uma analogia nas teorias do voo dos aviões; há duas explicações: uma baseada no diferencial de pressão exercida pelo ar sobre e sob a asa (maior em baixo, empurrando a asa para cima); e uma outra baseada na terceira lei de Newton: a acção provocando uma reacção. Ambas as teorias estão certas, ambas podem ser traduzidas em modelos matemáticos, ambas podem ser replicadas laboratorialmente e ambas possuem capacidade preditiva. Acaso o avião ou o ar atmosférico "conhecem" estas teorias? Certamente que não: o que lá se passa é uma interacção complexa, para o observador humano, que recorre a estas muletas que são as teorias, para aceder a uma "explicação" razoável do fenómeno, uma explicação que lhe sirva objectivos práticos ou satisfaça a sua curiosidade.
     Da mesma forma, actividades humanas tais como a criação de conhecimentos ou a tomada de decisões, são realidades complexas, das quais apenas nos podemos aproximar ao longe, através de teorias e conceitos necessariamente limitados. E essa limitação é inultrapassável: tal como um motor de explosão a dois tempos não se consegue explicar a si próprio (algo fácil para um humano, mas inacessível para o próprio motor, dada a sua simplicidade), também ao ser humano está vedado o explicar-se a si próprio: não pode aceder a um conhecimento que exige uma complexidade superior à dele próprio. Na falta de verdadeiras explicações, recorremos a analogias: isto é como aquilo. É talvez por isso que se recorre tanto à etimologia das palavras, sendo que sob a aparente diversidade dos actuais vocábulos se encontra um número restrito de palavras originais, elas próprias analogias de objectos: dedo, braço, cabeça, casa, etc.
     Veja-se, por exemplo, o caso as teorias geocêntrica e heliocêntrica do sistema solar; supostamente há um progresso da primeira para a segunda. Até há quem diga que a primeira estava errada e a segunda certa. O que pensa hoje é que o Universo não tem centro, existindo apenas interacção entre todos os corpos celestes; o Sol e a Terra articulam-se e atraem-se mutuamente, como se existisse uma corda a ligá-los, e este conjunto roda por sua vez em relação ao conjunto do Universo; deste ponto de vista, tanto a teoria geocêntrica como a heliocêntrica têm a sua dose de verdade. Mas se acreditássemos em Einstein (fingimos que sim, mas é apenas por ele ter uma carinha simpática) concluiríamos que nada disso se passa.
     Como já tem sido referido, as teorias, incluindo as teorias científicas, não passam de metáforas, mais ou menos complexas (isto é, mais ou menos difíceis de ensinar e compreender). Um dos que teve a humildade suficiente para reconhecer isto foi Newton, que apresentou a teoria da atracção universal dos corpos celestes mas disse: atenção, isto funciona assim, mas não faço ideia porque é que acontece. E ainda hoje persiste o mistério sobre o que será essa "força" que atrai os corpos celestes. Como é que um asteróide vem lá dos confins do sistema solar e, ainda a milhões de km de distância, começa a ter a trajectória afectada pelo Sol? Como é que ele sabe que o Sol está ali? Nós todos aprendemos e repetimos: é uma "força" que faz isso. Mas que "força" é esta? [Sérgio Godinho, lol!]. Na realidade, é apenas uma analogia com a "força" do nosso braço, exercida por acção muscular. Einstein também concluiu: não há força nenhuma, e as trajectórias dos corpos celestes nunca dão curvas: eles seguem "a direito" por um espaço que foi, ele próprio, "encurvado" pela existência das massas dos corpos celestes. Tal como quando dizemos que vamos "a direito" por uma determinada estrada, mas isso significa que acompanhamos as curvas da própria estrada. Ou seja: analogias, analogias, analogias! Metáforas, metáforas, metáforas!
     Há talvez aqui uma ponte entre o prazer da descoberta de conhecimentos (o momento "Eureka") e o prazer da fruição artística — paralela da relação entre a sinestesia e a criação artística, referida por Vilayanur Ramachandran no vídeo apresentado abaixo. É mais difícil detectar as metáforas no pensamento científico contemporâneo, embora ele seja evidente no do passado (por exemplo, na Astrologia, a analogia do Sol que se "deita" com diversos astros ao longo do ano, origem do Zodíaco). A satisfação provocada pelo estabelecimento dessas analogias — quer no descobridor original, quer nos que descobrem por aprendizagem — pode ser a mesma da fruição da obra artística, muito evidente ainda hoje na literatura, e com grande intensidade na poesia, mesmo quando as metáforas são aparentemente ilógicas ou improváveis. Na pintura dita realista isso é evidente, já não o sendo na pintura abstracta, onde todavia a "leitura", tal como a fazem os críticos de arte, é essencialmente assente num exercício sofisticado de analogias e metáforas, às quais não acede o pobre do leigo (e resta saber se essa separação entre os que "sabem", os "eleitos", e os que "não sabem", não será ela própria uma fonte de prazer e satisfação adicional).

terça-feira, outubro 30, 2007

     Vilayanur Ramachandran fala sobre como "enganou" o cérebro de um paciente que sofria de dores num membro fantasma, e também sobre sinestesia e a sua associação com o pensamento criativo e capacidades artísticas.
     São numerosos e bem documentados os exemplos de comportamentos humanos em que não valorizamos a informação recebida através dos nossos próprios sentidos. Já aqui foi referido o exemplo da influência sobre o nosso comportamento de um rosto desenhado num papel, como se alguém nos estivesse de facto a observar. As teorias do comportamento humano não conseguem incorporar esta realidade porque é incoerente com o paradigma racionalista.

terça-feira, outubro 23, 2007


A Ciência terá limites ?
Gulbenkian, 25 e 26 de Outubro
25 Out.26 Out.


10:30
  • George Steiner
    (Conferência de abertura)


    15h00 A teoria das cordas e o paradoxo da não-verificabilidade
  • Dieter Lüst: "Previsibilidade do panorama das cordas em Física das Partículas e em Cosmologia"
  • Peter Woit: "A teoria das cordas e a crise da Física das Partículas"


    17h00 Que progressos nas ciências da vida?
  • Gerald Edelman: "Da dinâmica do cérebro à consciência: nenhum limite à vista"
  • Wolf Singer: "Desafios nas Neurociências"

  • 09h30 Incompletude e inconsistência
  • Luis Alvarez-Gaumé: "Ideias e falsidades acerca da teoria das cordas
    e os limites da Ciência"
  • Lewis Wolpert: "Quanto precisamos de saber acerca das células? "


    12h00 Helga Nowotny: "A produção do conhecimento e as suas condicionantes:
    considerações epistémicas e societais


    15h00 O nosso entendimento sobre o lugar do homem no universo
  • Eörs Szathmáry: "Origens, perspectivas e limitações da Humanidade"
  • John Horgan: "O código neuronal, o último grande problema da ciência"


    17h00 Diálogo de encerramento
  • Freeman Dyson
  • Laura Bossi
  • Jean-Pierre Luminet

  • Página da conferência

    Bocejar e espreguiçar (sem remorsos)

    [...]
    Na escola ensina-se às crianças, na linha da tradição aristotélica, que dispomos de cinco sentidos. Mas talvez seja de admitir que possuímos um sexto sentido, a interocepção, a capacidade para nos apercebermos de estímulos sensoriais internos ao nosso corpo. O termo interocepção, ou somestesia vegetativa, foi proposto por Sherrington em 1905. Em 1749 Buffon propunha a voluptuosidade como sexto sentido retomando a ideia de Cardan em 1554. Não é a voluptuosidade o resultado de uma interocepção harmoniosa? O mundo animal conhece outros sentidos que nos são estranhos: a electro-recepção, a magneto-recepção e a ecolocalização por ultra-sons. Nós propomo-nos mostrar como o bocejo pertence à interocepção e participa desse modo ao nosso despertar e ao nosso esquema corporal.
    [...]
    Em resumo, uma ligação fenomenológica aparece entre a capacidade de atribuir um estado mental a outro (TOM - Theory of the Mind, base da empatia) e a ecoquinésia do bocejar. Paralelamente à hierarquia neuro-anatómica que separa a TOM em níveis sensomotores, emocionais e cognitivos (Singer, 2006), a ecoquinésia do bocejar autoriza uma dissociação da TOM, pela sua ontogénese e filogénese, em diferentes níveis de desenvolvimento, sustentados por uma activação diferenciada de circuitos neuronais específicos. A ecoquinésia do bocejar teria concedido uma vantagem selectiva pemitindo uma sincronização eficaz dos níveis de vigilância entre os membros de um grupo social. Ela participaria de uma forma de empatia instintiva involuntária, qualificável como rudimentar, provavelmente aparecida tardiamente no decurso da evolução dos hominídeos.

    Olivier Walusinski
    "Neurofisiología del bostezar y estirarse: su ontogenia y filogenia"

    terça-feira, agosto 28, 2007

    Autoscopia

         As "experiências sensoriais extra-corpóreas" constituem em fenómeno muito referido nos domínios da "parapsicologia" e outras pseudo-ciências. Trata-se de casos em que as pessoas sentem que "abandonam" o seu próprio corpo e o observam de fora. Muitos dos casos referidos provêm de pessoas que estiveram (ou acreditaram estar) quase a morrer. Mas também existem muitos casos relatados por pessoas que estavam sob o efeito de drogas alucinogénias. Creio que são estas as situações "retratadas" pelo cantor e compositor pop Paul Simon nestes versos do refrão de "American Tune":

    And I dreamed I was dying
    I dreamed that my soul rose unexpectedly
    And looking back down at me
    Smiled reassuringly
    And I dreamed I was flying.

         Em qualquer dos casos (proximidade apercebida da morte ou estados alterados pelo consumo de drogas) a excepcionalidade das situações deveria ser suficiente para se suspeitar de que se trata de um mero fenómeno corpóreo, e não da "revelação" de uma realidade oculta.
         Este tipo de estados, ou "ilusões", foram agora provocados em ambiente laboratorial controlado por investigadores suecos e ingleses, sob a orientação de Henrik Ehrsson. Os voluntários sentaram-se numa cadeira usando um par de óculos 3-D ligados a duas câmaras de vídeo colocadas lado-a-lado (para simular a visão estereoscópica) a dois metros de distância das costas do participante. Visionando as imagens captadas pelas câmaras, a pessoa podia ver as suas costas sob a perspectiva de alguém sentado lá atrás. Simultaneamente, o investigador tocava, com uma pequena vara, no corpo da pessoa e/ou no “corpo ilusório” apresentado nas imagens.
         Num questionário preenchido posteriormente pelos participantes alguns admitem ter tido a noção de que se estavam a observar a si mesmos de fora dos seus corpos, tal como sentiram que seu corpo real tinha sido tocado, mesmo nos casos em que isso só tinha acontecido na imagem virtual.
         Henrik Ehrsson coloca a hipótese de que "a ilusão é causada pela percepção visual dos voluntários em combinação e relacionada com a informação visual e táctil do corpo”.
         A nossa noção habitual é que que "estamos" dentro do nosso próprio corpo — as teses de António Damásio desenvolvem precisamente o contributo dos estados sensoriais externos e internos para noção do "eu" ("a consciência de si"). Ora, nestas experiências de Henrik Ehrsson, predomina a noção de que o "eu" está localizado atrás dos olhos; ou melhor, o "eu" é aquele que "vê".
         Evidentemente, o nosso corpo não só "vê" como sente simultaneamente outros "inputs" sensoriais (externos e internos); o que esta experiência faz é perturbar artificalmente esta unidade sensorial, fazendo crer (através dos óculos de video) ao observador que está a observar o seu próprio corpo duma posição afastada. Perante "inputs" contraditórios, a cobaia tem de decidir quais deles são verdadeiros. Numa lógica puramente racional, e porque a cobaia sabe que está a receber imagens artificiais, deveria desvalorizar esta informação; mas a valorização e organização das sensações não parece obedecer ao limitado mecanismo da análise racional.

    Artigos relacionados:
  • "The Experimental Induction of Out-of-Body Experiences" de H. Henrik Ehrsson, Science, 24 de Agosto de 2007
  • "That's My Hand! Activity in Premotor Cortex Reflects Feeling of Ownership of a Limb" de H. Henrik Ehrsson, Science 6 de Agosto de 2004
  • "Out-of-Body Experiences Enter the Laboratory" de Greg Miler, Science 24 de Agosto de 2007

  • domingo, junho 24, 2007


    Economic Cognition - apresentação de Benoit Hardy-Vallée com informações sobre neurociência e decisões económicas. (Em caso de má visibilidade clique o botão direito do rato sobre a imagem e faça zoom-in)

    sábado, junho 23, 2007

    Duplo comando

         Uma sondagem aos escalões superiores da cadeia de comando do cérebro humano descobriu forte evidência de que não existe apenas uma, mas dois comandos complementares encarregados do cérebro, de acordo com neurocientistas da Washington University School of Medicine, em St. Louis EUA. É como se os comandantes James T. Kirk e Jean-Luc Picard estivessem ambos na ponte de comando da nave Enterprise.
         Na realidade, estes dois comandantes são redes de diferentes regiões do cérebro que não se consultam uma à outra, mas mesmo assim trabalham para um objectivo comum - o controlo do comportamento voluntário orientado para objectivos. Isto abrange uma vasta gama de actividades desde ler uma palavra, até procurar uma estrela ou cantar uma canção. Mas não inclui comportamentos involuntários, tais como o controlo da pulsação ou a digestão.
         "Isto foi uma grande surpresa. Sabíamos que várias regiões do cérebro contribuiam para o controlo, mas a maioria acreditava que acabaríamos por ver todas estas regiões a ligar-se num único sistema, um tipo a dizer a todos os outros o que fazer", disse um dos invetigadores, professor Steven Petersen.

    Science Daily

    quinta-feira, maio 17, 2007

    Felicidade


    Prémio britânico para livros de ciência atribuído a best-seller sobre a felicidade
    Jornal "Público", 17.Maio.2007, Ana Gerschenfeld

         O livro intitula-se Stumbling on Happiness ("Tropeçar na felicidade"), é da autoria do psicólogo experimental norte-americano Daniel Gilbert e acaba de ser recompensado em Londres com o prestigiado Prémio da Royal Society para livros de ciência.
         Apesar da terceira palavra do título, diz Gilbert logo no prefácio, não se trata de um manual de auto-ajuda, com instruções para sermos felizes. "É um livro que descreve o que a ciência tem a dizer sobre como e até que ponto o cérebro humano é capaz de imaginar o seu próprio futuro, e sobre como e até que ponto consegue prever de qual desses futuros irá gostar mais".
         Gilbert, professor da Universidade de Harvard, é considerado a autoridade máxima no estudo da "previsão afectiva" - isto é, da nossa capacidade de prevermos os nossos estados emocionais futuros. E diz que, irresistivelmente, quando prevemos quão felizes ou infelizes vamos ficar se nos acontecer isto ou aquilo, falhamos quase sempre a previsão: os momentos previsivelmente muito felizes acabam por não o ser assim tanto, e aquilo que receávamos ser um futuro sinistro nem sempre nos faz ficar tão infelizes como antevimos.
         Uma massa crescente de dados experimentais, obtidos por Gilbert e por outros investigadores nos últimos anos, mostra que essa capacidade preditiva está claramente enviesada devido à maneira como o nosso cérebro funciona. O livro, escrito com grande sentido de humor e numa linguagem muito coloquial e acessível, acabou por conquistar os membros do júri.
         Os concorrentes eram, entre outros, Eric Kandel, Nobel da Medicina no ano 2000 pelo seu trabalho sobre as bases biológicas da memória, com o seu livro In Search of Memory; Henry Nicholls com Lonesome George, a história de uma célebre tartaruga das Galápagos; e o especialista em evolução humana Chris Stringer, com Homo Britannicus.
         Ao receber o prémio, num montante de cerca de 15 mil euros, Gilbert declarou: "São poucos os países (incluindo o meu) onde um livro provocador sobre a felicidade pode ganhar um prémio de ciência - mas foram os britânicos que inventaram o humor intelectual e sempre perceberam que o conhecimento e o entretenimento são amigos por natureza".
         Tropeçar na felicidade, de Daniel Gilbert. O professor de Harvard vai dar uma conferência em Lisboa para a semana.

    quinta-feira, março 22, 2007


    António Damásio

    Lesões no cérebro geram escolhas morais anormais

         «A equipa do neurocientista António Damásio quis saber se as emoções são ou não essenciais ao funcionamento do nosso eu moral
         «a Você sabe que uma dada pessoa tem sida e que tenciona deliberadamente infectar outras. Algumas dessas pessoas irão com certeza morrer. As duas únicas opções que você tem são deixar que isso aconteça ou matar a pessoa. Você carrega no gatilho?
         «A mera hipótese de virmos a ser confrontados com uma escolha destas, mesmo que retoricamente, provoca-nos arrepios, tal é a nossa aversão natural à ideia de tirar a vida a outro ser humano. No entanto, há pessoas que respondem pela afirmativa quando este cenário imaginário lhes é colocado. E essas pessoas, que basicamente não hesitariam em obliterar uma vida humana "em nome do bem colectivo", apresentam lesões numa região do seu cérebro necessária à produção de emoções.
         «António Damásio, da Universidade da Califórnia do Sul (USC), Marc Hauser, especialista do comportamento animal da Universidade de Harvard, e os seus colegas quiseram saber o seguinte: perante um dilema moral deste género, será que os sentimentos que nos acossam são somente uma consequência do horror da situação evocada? Ou será, pelo contrário, graças ao nosso cérebro "emocional" que somos capazes de fazer a escolha moral mais humana - a menos utilitária e fria -, recusando-nos a entrar na pele de um homicida justiceiro?
         «Para Damásio, autor do célebre livro O Erro de Descartes, a razão humana precisa das emoções para funcionar: não há escolha racional acertada na vida real sem a participação das emoções, da intuição, das nossas vísceras. Quanto a Hauser, autor de um recente livro intitulado Moral Minds: How Nature Designed Our Universal Sense of Right and Wrong, tem estudado nos animais os comportamentos precursores dos comportamentos morais humanos.
         «Estes cientistas concluem hoje, num artigo publicado na revista Nature, que as emoções desempenham efectivamente um papel essencial no nosso desempenho moral. Sem elas, o nosso juízo moral não funciona. "O nosso trabalho fornece a primeira demonstração causal do papel das emoções nos juízos morais", diz Hauser, citado por um comunicado conjunto da USC, da Harvard e do Caltech.
         «Os investigadores apresentaram uma série de 13 dilemas morais deste tipo a 30 pessoas de ambos os sexos. Desses voluntários, seis tinham lesões no córtex prefrontal ventromedial (VMPC), 12 tinham outras lesões cerebrais e 12 não tinham lesões. O VMPC, situado ao nível da testa, faz parte dos circuitos "emocionais" do cérebro.
         «Embora o dilema referido mais acima não fizesse parte do conjunto sob essa forma, algumas das escolhas propostas eram talvez mais arrepiantes ainda. Por exemplo: "Soldados inimigos invadiram a sua aldeia. Você e outros refugiam-se num sótão [...] O seu bebé começa a chorar. [...] Você tapa-lhe a boca. [...] Para salvar a sua própria vida e a dos outros você precisa de matar o seu filho por asfixia. Você asfixiaria o seu bebé para salvar a sua própria vida e a dos outros?"
         «Também foi pedido aos participantes para responderem a outros tipos de dilemas - uma série de dilemas morais menos pessoais e uma série de dilemas sem componente moral. Mas foi apenas perante os dilemas morais em que a morte imediata de alguém serve para evitar a morte futura de muitos que as diferenças entre as pessoas com lesões no VMPC e as outras se tornaram gritantes, com uma proporção significativamente mais elevada de respostas afirmativas, neste grupo, à resolução dos dilemas pelas armas, por assim dizer.
         «"O que é absolutamente espantoso", acrescenta Hauser, "é a selectividade deste défice. As lesões do lóbulo frontal deixam intactas toda uma série de capacidades na resolução de problemas morais, mas afectam os juízos nos quais uma acção que provoca aversão é colocada em conflito directo com um desfecho fortemente utilitário". Por seu lado, Ralph Adolphs, do Caltech, explica: "Devido às suas lesões cerebrais, [as pessoas com lesões no VMPC] apresentam emoções anormais na vida real. Falta-lhes empatia e compaixão."»

    Os humanos rejeitam o calculismo extremo

         «Os juízos morais que aliam a razão e a emoção reflectem uma sabedoria acumulada ao longo da evolução. Segundo o neurologista António Damásio, co-autor do estudo hoje publicado pela revista britânica Nature, este tipo de trabalho também tem implicações na área da filosofia. Damásio acha que, hoje em dia, existem ferramentas científicas que deverão permitir testar a validade de diversos sistemas filosóficos e crenças tradicionais.
         «Em particular, o investigador põe em causa a filosofia kantiana e a sua visão da racionalidade, inclinando-se a pensar que as provas científicas de que já dispomos tendem, pelo contrário, a confirmar as ideias de David Hume, filósofo do século XVIII cuja ética tinha por base as emoções.
         «O PÚBLICO pediu ao cientista português radicado nos Estados Unidos, onde dirige o Instituto do Cérebro e da Criatividade na Universidade da Califórnia do Sul, para comentar os resultados da sua investigação.
         «Pensa que, com base no tipo de trabalho que desenvolve, as neurociências serão capazes de dizer qual dos dois filósofos - Hume e Kant - tinha razão na sua visão do funcionamento do raciocínio humano?
         «Penso. E a resposta será que ambos tinham razão, em função das circunstâncias. Mas no plano geral, Hume está mais próximo da minha visão dos seres humanos - embora não totalmente.
         «Pode-se dizer que os resultados que obtiveram agora mostram que os seres humanos não são biologicamente aptos a terem raciocínios puramente utilitários?
         «Efectivamente, o nosso estudo sugere que os humanos rejeitam as formas extremas de calculismo utilitário. Essa rejeição está ligada à produção de emoções sociais. Penso que esta forma mista de juízo moral, que alia a razão à emoção, é a manifestação de uma sabedoria lentamente acumulada ao longo da evolução (tanto biológica como cultural). Os juízos mais simples não exigem esta combinação, sendo possível lidar com eles ou somente com a razão ou somente com reacções emocionais.
         «À luz deste estudo, o que dizer de personagens excepcionalmente impiedosas como Estaline, Hitler ou Mao, que não hesitavam em massacrar milhões de pessoas em nome de um suposto "bem-estar colectivo"? É possível que tenham sofrido de alguma lesão cerebral?
         «Não é preciso ter uma lesão cerebral para se comportar impiedosamente. Penso que na sua maioria, os déspotas são provavelmente deficientes emocionais e até é possível que os factores biológicos desempenhem efectivamente algum papel. Mas uma "disfunção cerebral" pode existir sem que haja uma "lesão cerebral" clara. A melhor maneira de descrever estas personagens despóticas é dizer que se trata de psicopatas narcisistas, que tentam alcançar altas recompensas através da sua brutalidade.
         «A sua colaboração neste estudo com Marc Hauser, um especialista do comportamento animal, pode parecer insólita. Será que os animais possuem algum instinto moral? Que conseguem distinguir o bem do mal?
         «Os animais complexos, como os chimpanzés, apresentam comportamentos que são precursores das emoções sociais e, portanto, de certas regras morais simples. Por exemplo, ajudam os outros, quando estes estão em apuros, o que constitui um comportamento de compaixão.»

    Ana Gerschenfeld, jornal Público

    quarta-feira, fevereiro 28, 2007

    «O Homem não é um ser inteligente. É um ser instintivo dotado de inteligência.

    Argumento:

    «É óbvio, dada a a natureza da evolução e da história evolutiva da Humanidade, que a inteligência humana foi um acrescento numa criatura instintiva. Este novo factor fez aumentar a capacidade humana para sobreviver e tornar-se avô, ao proporcionar uma mais ampla escolha de comportamentos e adicionando controlo intelectual aos instintos. O Homem moderno, tal como acontecia com os seus antepassados, é movido pelo instinto. Ele tem, se o quiser usar, controlo intelectual sobre o seu próprio comportamento. Em tempos antigos o ambiente forçou-o a exercer esta auto-disciplina. Foi a acção pensada que lhe permitiu sobreviver.

    «Os instintos do homem antigo eram a sua razão de vida. O seu raciocínio permitia-o viver.

    «A remoção dos perigos no ambiente do Homem moderno (pela sua própria criatividade e orientação) resultou em duas forças destrutivas, qualquer das quais, só por si, destruirá a espécie: 1. a paragem do processo de limpeza da base genética pelo ambiente, o que tem como resultado a degeneração da mente e do corpo até um eventual colapso da espécie, e 2. a dispensa da auto-disciplina como modo de vida, o que, com o tempo, fará degenerar a cultura (comportamento) humano até ao ponto do caos comportamental.»

    in "The Evolution of the Human"

    segunda-feira, fevereiro 05, 2007

    Altruísmo e Agência


    "Altruism is associated with an increased neural response to agency"
    Dharol Tankersley, C Jill Stowe e Scott A. Huettel

    Nature Neuroscience nº 10, 150-151 (2007)

    «Embora os mecanismos neurais subjacentes ao altruísmo permaneçam desconhecidos, a empatia e as suas componentes, tais como a percepção das acções e intenções de outros, têm sido propostas como contribuidores-chave. Tarefas que exigem a percepção da agência activam o cortex temporal posterior superior (pSTC), particularmente no hemisfério direito. Aqui, demonstramos que a activação diferencial do pSTC humano durante a percepção da acção versus a "perfomance" da acção, prediz o altruísmo auto-assinalado.»

    quinta-feira, janeiro 11, 2007

    Cérebro quântico

    A "NeuroQuantology" é uma revista que se publica desde 2003, e que se apresenta como "uma publicação interdisciplinar da Neurociência e da Física Quântica". A última edição apresenta alguns artigos sobre a hipótese do "cérebro quântico", com a curiosidade da revelar algumas experiências que "provam" a existência de um efeito não local de uma substância química sobre a actividade cerebral, através do "entrelaçamento quântico". Embora o entrelaçamento quântico seja aceite em termos de partículas, a hipótese de que a passagem de impulsos magnéticos através de um analgésico, na direcção dum cérebro humano, pode "transportar" para lá os efeitos analgésicos, parece-se muito com charlatanismo. No entanto, aqui fica a referência.

  • "Evidence of Non-local Physical, Chemical and Biological Effects Supports Quantum Brain" - Huping Hu, Maoxin Wu

    «Realizámos experiências [...] para testar a possibilidade de entrelaçamento quântico [quantum-entangling] das entidades quânticas no interior do cérebro com as de uma substância química externa. Descobrimos que a aplicação de impulsos magnéticos ao cérebro quando um anestésico era colocado de permeio, leva o cérebro a sentir o efeito desse anestésico, tal como se o indivíduo o tivesse inalado. Também descobrimos que a ingestão de água exposta a impulsos magnéticos, luz laser ou micro-ondas, quando um anestésico é colocado de permeio, também causa efeitos cerebrais em diversos graus. Através de experiências adicionais verificámos que o referido efeito cerebral era de facto consequência do entrelaçamento quântico. Estes resultados contrastam a crença de que o entrelaçamento quântico só por si não pode ser utilizado para transmitir informação e apoia a possibilidade de um cérebro quântico.»

  • "Dynamics and Adaptation: Consciousness, Cognitive Science, and Quantum Mechanics" - Jon R. Courtney

    «Este artigo examina o ponto de situação de algumas das explicações da consciência, comparando e avaliando os pontos de vista da Psicologia (isto é, conhecimento) e da Física (isto é, mecânica quântica). Sugere-se que as duas abordagens possuem similaridades tanto ao nível metodológico como teórico, e que devem beneficiar de consideração mútua.»

  • quinta-feira, janeiro 04, 2007

    Neurologia das compras

    Cientistas espreitam para o cérebro de quem faz compras

    «O que se passa no nosso cérebro, quando decidimos comprar algo? É uma luta entre áreas relacionadas com o prazer das recompensas e com a dor, por termos de pagar pelo objecto do nosso desejo, concluíram cientistas que espreitaram para dentro do cérebro de voluntários que participaram numa simulação de compras.
    «A equipa de Brian Knudson, da Universidade de Stanford (EUA), usou exames de ressonância magnética funcional, que permitem ver alterações no fluxo sanguíneo no cérebro, enquanto as pessoas estão a realizar determinadas acções. No caso, os voluntários tinham de tomar decisões rápidas, quando confrontados com uma série de produtos e respectivos preços, que poderiam escolher comprar ou não.
    «A equipa relata num artigo na revista Neuron que conseguia prever se um indivíduo ia comprar ou não um produto, olhando para o padrão de actividade cerebral revelado pelo exame.
    «Os cientistas concluem assim que "as decisões de comprar podem envolver distintas dimensões, relacionadas com a antecipação de ganhos e perdas". O seu trabalho, dizem, "tem implicações para compreender anomalias comportamentais, como a tendência para gastar de mais ou de menos, sobretudo se se usa o cartão de crédito. "A natureza abstracta do cartão de crédito, juntamente com o facto de só se pagar mais tarde, pode anestesiar os consumidores contra a dor de pagar", escrevem.»

    jornal Público

    segunda-feira, dezembro 18, 2006

    Iodo

    «Valentina Sivryukova [Directora do Departamento do Desenvolvimento Social, Kasaquistão] percebeu que o seu programa de saúde pública estava a atingir resultados quando tomou conhecimento de como é que um estudante do Kazaquistão chamou estúpido a outro: "Qual é o teu problema - falta de iodo, ou quê?" ["What are you, iodine-deficient or something?"]

    Acho que vou começar a usar este insulto!

    Eu sabia que a certa altura o iodo era adicionado ao sal por qualquer motivo de saúde pública, mas nunca soube exactamente qual. Parece que a insuficiência de iodo pode provocar uma quantidade de problemas desagradáveis. Existem estudos que provam que a deficiência de iodo é a principal causa — entre as que são susceptíveis de prevenção — de atraso mental. Mesmo uma deficiência ligeira, especialmente em mulheres grávidas e crianças, faz baixar o nível de inteligência entre 10 a 15 pontos do I.Q.»

    Iodine Deficiency

    O Homem Moral

         «Enquanto o seu fundador escocês, Adam Smith, analisou a sociedade dando especial atenção à natureza humana - e particularmente aos sentimentos morais - a Economia virou as costas (em parte para facilitar a utilização de modelos) aos seres humanos reais, e considerou um universo de 'agentes' abstractos, racionais, egoístas e maximizadores. O Homo Sapiens deu lugar ao Homo Economicus.
         Mas actualmente a Teoria da Decisão está a fazer uma inflexão cognitiva, através do que tem sido designado como 'Neuroeconomia'. Estes investigadores estão a demonstrar o que a teoria evolucionista conjecturou já há algum tempo: que o homem é em parte um animal moral; a sua racionalidade não é a da modelização abstracta; é constituída por um conjunto de heurístícas limitadas, ecologicamente especializadas e, por vezes, isoladas do resto da actividade cognitiva. Muitas heurísticas deste tipo, particularmente no domínio moral, tomam a forma de intuições 'difíceis-de-justificar' e 'impossíveis-de-ignorar'. Não procuram maximizar apenas a sua própria utilidade. À medida que os fundamentos neurais dos homens económicos reais são reveladas pela Economia experimental, em colaboração estreita com a Neurociência, a Antropologia também se junta a esta investigação para completar o quadro com assumpções universalmente válidas. Juntas, estas abordagens prometem reconciliar o Homem Económico com a sua contrapartida biológica e cultural.»

    in AlphaPsy

    segunda-feira, dezembro 04, 2006

    "É a genética, estúpido"

         Imoso, o macho de mais "alta patente" da comunidade Kanyawara, no Parque Nacional de Kibale, no Uganda, é um dos exemplos que está a agitar a comunidade dos humanos com a sua "preferência revelada" por acasalar com fémeas mais velhas. Tratando-se da espécie mais próxima, em termos evolutivos, dos humanos, os cientistas colocam agora a hipótese de que a preferência destes últimos por parceiros mais novos seja um "fenómeno recente" em termos evolutivos - veja-se o artigo na revista Current Biology. A explicação para adiscrepância estaria no facto dos humanos estabelecerem relações de longa duração - ao contrário dos chimpanzés. "Amarrados" a uma companhia durante muito tempo, viram-se para gente mais nova...
         Mas este facto também pode servir para lançar alguma luz sobre a natureza de story telling de muita da "ciência" evolutiva actual (e que muitos economistas andam a copiar). Tendo detectado essa tendência dos humanos para acasalar com parceiros mais novos, logo os cientistas concluiram que esse comportamento tinha sido, "evidentemente", seleccionado pelas leis da evolução: parceiros mais novos apresentariam maiores hipóteses reprodutivas, logo a genética valorizou esta opção.
         Num refinamento deste raciocínio, também se concluiu que a preferência dos homens por mulheres com determinadas "medidas" (o famoso rácio cintura/ancas de 0,7 que vem desde a Venus de Milo até Selma Hayek) nada mais seria do que a "preferência (involuntariamente) revelada" dos homens por espécimenes mais jovens e saudáveis, atributos traduzidos nesses indicadores somáticos. Parafraseando o outro: "É a genética, estúpido".
         Como nunca ninguém viu (nem poderia ver) a genética a incorporar este comportamento nos humanos, a hipótese só pode ser especulativa, e não-falsificável.
         Veja-se, como exemplos desta especulação, o recente artigo de Fisher e Voracek, "The shape of beauty: determinants of female physical attractiveness", que analisaram não só o rácio, mas igualmente o efeito de "curvatura". Igualmente interessante é o seu artigo "Success Is All in the Measures: Androgenousness, Curvaceousness, and Starring Frequencies in Adult Media Actresses", que avaliou o efeito de algumas das medidas na excitação masculina.
    [encontrei a referência a este tema no blog Mahalanobis.]

    quinta-feira, novembro 30, 2006

    Defesa da Economia acéfala

    "The Case for Mindless Economics" [pdf]
    Faruk Gul e Wolfgang Pesendorfer
    Novembro de 2005

         «A Neuroeconomia propõe alterações radicais nos métodos da Economia. Este ensaio discute as mudanças propostas na metodologia, juntamente com a crítica neuroeconómica da Economia padrão. A nossa definição de Neuroeconomia inclui investigações que não fazem referência específica à Neurociência e que é tradicionalmente referida como Psicologia e Economia. Identificamos a Neuroeconomia como a investigação que implícita ou explicitamente defende uma das seguintes duas propostas:

    Asserção I - A evidência psicológica e fisiológica (tais como descrições de estados hedónicos e processos cerebrais) são directamente relevantes para as teorias económicas. Em particular, elas podem ser usadas para suportar ou rejeitar modelos económicos ou até mesmo a metodologia económica.

    Asserção II - Aquilo que faz os indivíduos felizes ('utilidade verdadeira') é diferente daquilo que eles escolhem. A análise do bem-estar económico deve usar a utilidade verdadeira em vez das utilidades que orientam a escolha ('utilidade escolhida').
    [...]
         «Na secção 5 deste ensaio, argumentamos que a Asserção I da crítica neuroeconómica falha a compreensão da metodologia da Economia e subestima a flexibilidade dos modelos padrão. A Economia e a Psicologia colocam questões diferentes, utilizam diferentes abstracções, e procuram um tipo diferente de evidência empírica. A evidência obtida pela Neurociência não pode refutar os modelos económicos porque estes não fazem assumpções nem tiram conclusões acerca da psicologia do cérebro. Da mesma forma, a ciência do cérebro não pode revolucionar a Economia porque não tem capacidade para abordar as preocupações da Economia. Também argumentamos que os métodos da Economia padrão são mais flexíveis do que é assumido pela crítica neuroeconómica e apresentamos exemplos de como a Economia padrão lida com as preferências inconsistentes, erros e preconceitos.
         «Os neuroeconomistas vão buscar questões e abstracções à Psicologia e reinterpretam os modelos económicos como se o seu fim fosse responder a essas questões. O modelo económico padrão da escolha é tratado como um modelo do cérebro e é considerado inadequado. A Economia, ou é tratada como ciência amadora do cérebro e rejeitada como tal, ou a evidência cerebral é tratada como evidência económica para rejeitar os modelos económicos.
         «Kahneman afirmou que os estados subjectivos e a utilidade hedónica são "tópicos de estudo legítimos. Isto pode ser verdade, mas tais estados e utilidades não servem para calibrar e testar os modelos económicos padrão. As discussões acerca de experiências hedónicas não têm lugar na análise económica padrão porque a Economia não faz previsões acerca delas e não possui dados para testar tais previsões. Os economistas também não possuem meios para integrar medições da utilidade hedónica com dados económicos padrão. Por isso, consideraram apropriado confinar-se à análise destes últimos.
         «O programa da Neuroeconomia para mudanças na Economia ignora o facto de que os economistas, mesmo quando lidam com questões relacionadas com as que se estudam em Psicologia, têm diferentes objectivos e abordam evidência empírica diferente. Estas diferenças fundamentais são obscurecidas pela tendência dos neuroeconomistas em descrever ambas as disciplinas em termos muito amplos.»

    segunda-feira, novembro 27, 2006

    Meta-estabilidade

    "Neuroeconomics and the metastable brain" (pdf)

    Oullier O, Kelso JA.
    Trends in Cognitive ScienceS. 2006 Aug;10(8):353-4.

    «Num recente artigo Sanfey e outros sugerem que a Neuroeconomia deve apoiar-se na "perspectiva unitária" da Economia e na "abordagem de sistemas múltiplos" da Neurociência para desafiar as teorias clássicas da tomada de decisão apoiadas na racionalidade. Eles defendem a noção de que as ideias da Economia poderão fornecer luz a um dos grandes enigmas da neurociência - como é que são coordenadas as diferentes zonas do cérebro para produzir um comportamento dirigido a objectivos. Numa tentativa de ultrapassar a separação conceptual entre dois campos tão dispares, Sanfey e os seus colegas propõem uma analogia entre o modus operandi do cérebro e uma corporação. Ambos são apresentados como sistemas governados por um controlo executivo que interage com agentes especializados mais ou menos independentes, que transformam input em output

    Uma abordagem alternativa para este modelo puramente hierárquico é a 'coordination dynamics'. Inspirada em princípios de auto-organização especialmente concebidos para as necessidades das funções cognitivas e funcionamento do cérebro, a 'coordination dynamics' propões que os estados da mente, manifestados como padrões de coordenação no cérebro, nascem espontaneamente de acoplamentos não lineares entre os componentes em interacção. Quais os padrões que se criam, depende da sua estabilidade sob certos contrangimentos. À medida que as circunstâncias mudam, um padrão pode perder estabilidade e um outro pode emergir espontanemente, porque se adapta melhor às necessidads do momento. Esta tomada de decisão e a selecção de padrões dependentes do contexto têm sido observadas e modelizadas aos níveis comportamental e cerebral.

    Um aspecto inovador da coordination dynamics é o de que, para além de onde ocorrem os estados de coordenação estáveis, existe um regime "meta-estável" mais subtil. A meta-estabilidade - 'um novo princípio do funcionamento cerebral'- é caracterizado por tendências parcialmente coordenadas nas quais os elementos de coordenação individual não são, nem completamente independentes (segregação local) nem totalmente ligados numa relação mútua fixa (integração global).
    [...]
    A dinâmica de coordenação meta-estável parece estar a ganhar aceitação na comunidade neurocientífica, de acordo com o crescente número de sínteses que tem proporcionado. Como quadro conceptual para a tomada de decisão espontânea que respeita ambas as dinâmicas do cérebro e da economia, sugerimos que a meta-estabilidade é um complemento útil para o modelo hierárquico proposto por Sanfey, podendo esperar-se que se torne num activo participante no desenvolvimento do camplo transdisciplinar da Neuroeconomia.»


    Decisão

    "Neural basis of quasi-rational decision making" (pdf)
    Daeyeol Lee

    «As teorias económicas padrão concebem o homo economicus como um decisor racional capaz de maximizar a utilidade. Na realidade, contudo, as pessoas tendem a aproximar-se de estratégias de decisão óptima através de um conjunto de rotinas heurísticas. Algumas destas rotinas são movidas por processos emocionais, e outras são ajustadas interactivamente através da experiência. Adicionalmente, rotinas especializadas na tomada de decisão social, tais como a inferência dos estados mentais dos outros decisores, podem partilhar as suas origens e mecanismos neurais com a capacidade para estimular ou imaginar resultados esperados de acções alternativas que um individuo pode tomar. Uma recente vaga de colaborações entre a economia, a psicologia e a neurociência forneceu novas visões sobre como estes múltiplos elementos de decisão interagem com o cérebro.»


    Indivíduo e instituições

    "Neuroeconomics: Best to go with what you know"
    Daeyeol Lee
    Nature 441, 822 - 823 (15 Junho 2006)

    «A Neuroeconomia é um program interdisciplinar de investigação como o bjectivo de construir um modelo biológico da tomada de decisão em ambiente económico. Os neuroeconomistas perguntam como é que o cérebro capacita a mente (ou grupos de mentes) para tomar decisões económicas. Combinando técnicas da ciência cognitiva e da economia experimental podemos agora observar a actividade neural em tempo real, ver como é que esta actividade depende da envolvência económica e testar hipóteses sobre como é que a mente toma decisões económicas. A Neuroeconomia permite-nos uma melhor compreensão tanto da grande heterogeneidade do comportamento humano como do papel das instituições enquanto extensões das nossas mentes.»

    Mulheres sentem emoções mais intensamente

         Segundo notícia da Lusa/Público, «As mulheres sentem as emoções com maior intensidade do que os homens, revela um estudo científico inédito realizado em Portugal. Denominado Construção psicológica das emoções: o efeito do movimento dos músculos da face. Estudo empírico com portugueses, o trabalho foi realizado pelo Laboratório de Expressão Facial da Emoção e pretendeu perceber de que forma os músculos faciais podem exibir as emoções básicas.
         No estudo participaram 338 portugueses (169 mulheres e 169 homens), de idades compreendidas entre os 18 e os 70 anos. As emoções escolhidas foram medo, desprezo, tristeza, fúria, felicidade e surpresa. O procedimento consistiu em solicitar aos participantes que usassem os 46 músculos faciais para exibir as emoções, explicou o director do Laboratório de Expressão Facial da Emoção, Freitas Magalhães.
         As conclusões do estudo referem que as mulheres sentem as emoções com maior intensidade do que os homens. As emoções foram sentidas mais intensamente também entre os participantes com idades entre os 40 e os 60 anos, factor que está relacionado com a aprendizagem e com o facto de as pessoas mais idosas terem uma maior predisposição para as emoções, segundo Freitas Magalhães.»

    sábado, novembro 25, 2006

    Emoções: regresso do filho pródigo


    Texto publicado na revista DiaD, do jornal Público - 24 de Novembro de 2006

         As investigações que se estão a fazer no campo das neurociências, nomeadamente aquelas em que se procura compreender os processos de tomada de decisão, acabarão por ter consequências sobre a teoria económica. Os economistas, por pouco que isso lhes agrade, terão de o aceitar. Afinal, não foi a Economia que se aventurou por territórios alheios, procurando explicar fenómenos como o casamento ou o crime, com recurso às leis económicas e aos mercados?
         Os trabalhos de investigadores como António Damásio, com a sua proposta de uma maquinaria neuronal dupla – racional e emocional – a participar activamente nas decisões dos humanos, apresenta já evidentes pontos de contacto com a teoria económica, e muitas das suas experiências laboratoriais recorrem mesmo a jogos e simulações típicas da Economia. Uma das suas linhas de investigação é sobre se o ser humano é fundamentalmente egoísta ou não, o que constitui também um dos problemas centrais da teoria económica.
         Alguns críticos do postulado da racionalidade na teoria económica já começaram a citar estas investigações como sendo mais uma prova da fragilidade desse pilar da ortodoxia. As sugestões de que o ser humano é incapaz de uma racionalidade absoluta – desde logo, pela impossibilidade material de aceder e processar toda a informação relevante para uma decisão racional – são antigas. Mas agora que nos laboratórios dos neurocientistas, com recurso à maravilhosa (e cara) maquinaria da imageologia cerebral, se descobrem “provas” de que as decisões humanas “normais” são tomadas tanto com recurso ao pensamento racional como ao mecanismo das emoções, a balança pode bem começar a pender para o lado destes críticos. Mas será mesmo assim?
         Bem, pode até ser o contrário. Perante as evidentes limitações do pensamento racional foram propostas algumas variantes, tais como a da “racionalidade limitada”, segundo a qual o indivíduo não decidiria em função de todas as hipóteses possíveis, mas apenas de um conjunto limitado de variáveis, consideradas “mais relevantes”. No entanto, esta teoria não explica como é que se escolhem as variáveis “relevantes”: para o fazer teriam de se ponderar todas as hipóteses possíveis, o que nos remete para o início do problema. Noutras formulações diz-se que é através da tentativa e erro que os indivíduos se aproximam da “decisão racional” absoluta.
         E é aqui que o mecanismo das emoções, tal como é entendido por António Damásio na sua “hipótese do marcador somático”, pode vir em socorro do postulado da racionalidade. O marcador somático seria o instrumento privilegiado da tal aprendizagem por tentativas, ou da selecção das variáveis “relevantes”.
         Admito que esta ideia pareça fantástica, ou fantasiosa, mesmo para os defensores da ortodoxia. A ser verdade, isso significaria que o mecanismo das emoções tem uma capacidade superior para “aprender com o passado” e iluminar o futuro, e tudo isso com a ajuda de uma memória emocional que é provavelmente semelhante à que parece existir também em outros mamíferos. “Gato escaldado de água fria tem medo”, costumamos nós dizer, com desprezo, precisamente para ilustrar um comportamento exageradamente defensivo, apoiado numa avaliação não racional. Mas será que é mesmo exagerado? O pensamento racional acha que sim, mas neste caso é juíz em causa própria.
         Aparentemente o mecanismo das emoções precedeu o do pensamento racional em termos evolutivos. Isso quer dizer que teve muito mais tempo para se aperfeiçoar. E provavelmente consome menos energia que os circuitos da racionalidade - admite-se até que seja por isso que mais nenhuma espécie optou pela via da racionalidade. Quem é que quer um luxuoso mecanismo racional, de tal modo consumista que nos obriga a procurar mais comida, quando se pode conseguir o mesmo com um órgão mais simples? Até mesmo as limitações do pensamento racional podem estar relacionadas com problemas de “economia”: maior velocidade e mais variáveis em ponderação significariam uma despesa incomportável
         A história da economia está cheia de casos de sucesso decorrentes de comportamentos intuitivos, que se movem “não se sabe lá muito bem como”, frequentemente contra os conselhos da racionalidade prudente. Aceitar que isso decorra dum mecanismo “inferior”, o qual parece mais controlar-nos do que nós o controlamos a ele, mecanismo esse que, provavelmente, partilhamos com outras espécies animais – eis uma ideia que a sociedade não vai aceitar sem luta. Se não, qualquer dia ainda lhe vão dizer que formas de aprendizagem como a da recruta militar são o equivalente humano do adestramento de animais…
         No entanto, até nos actos mais vulgares do nosso dia-a-dia se apresentam mistérios que poderiam ser melhor explicados, e compreendidos, por essa nossa desprezada ferramenta. Porque é que demoramos tanto tempo a aprender a conduzir um automóvel, quando o pensamento é capaz de compreender a racionalidade da coisa em menos de meia hora? E quem é que toma as decisões quando guiamos “automaticamente” esse mesmo veículo por um percurso familiar, sendo evidente que a atenção foi apenas um passageiro distraído da viagem?

    quinta-feira, novembro 02, 2006

    quarta-feira, outubro 18, 2006

    Enxaqueca

    "Anatomical Alterations of the Visual Motion Processing Network in Migraine with and without Aura"
    artigo de Cristina Granziera, Alexandre F. M. DaSilva, Josh Snyder, David S. Tuch, Nouchine Hadjikhani

    Notícia no jornal Publico:

         «Pela primeira vez, encontraram-se diferenças na estrutura do cérebro de pessoas que sofrem de enxaqueca. No trabalho, publicado esta semana na revista PLoS Medicine, de acesso livre na Internet, investigadores da Escola Médica de Harvard, nos Estados Unidos, relatam a descoberta de que duas áreas do córtex cerebral são mais espessas em quem sofre de enxaqueca do que em indivíduos saudáveis.
         [...]
         «Não se sabe o que causa exactamente a enxaqueca, mas alguns cientistas pensam que o cérebro das suas vítimas é hiperexcitável - ou seja, algumas células nervosas reagem de forma exagerada quando recebem estímulos do corpo. Isto gera uma perturbação, que causa a aura, dores de cabeça e os restantes sintomas.
         «Para procurar eventuais diferenças no córtex cerebral que pudessem constituir a base anatómica da enxaqueca, os investigadores usaram duas técnicas de imagem por ressonância magnética, um método não invasivo de obter imagens de órgãos internos. Foram analisados 24 pacientes de enxaqueca (12 que sofrem do tipo de enxaqueca com aura e outros 12 do tipo sem aura), além de 15 pessoas saudáveis com a mesma distribuição etária, que serviram de controlo.
         «Foram estudadas duas áreas cerebrais relacionadas com a percepção visual do movimento (conhecidas por MT+ e V3A). Verificou-se que a espessura cortical de ambas as áreas é maior nos indivíduos com enxaqueca do que nos saudáveis. Não foram, no entanto, encontradas diferenças na espessura cortical entre pacientes com aura e sem aura.» [...]

    quarta-feira, outubro 11, 2006


    Revista Neurology, edição de Outubro de 2006:

  • "Relation between body mass index and cognitive function in healthy middle-aged men and women"
    Investigação acerca da relação entre o Índice de Massa Corporal e funções cognitivas e declínio cognitivo. Investigação realizada em 2.223 pessoas saudáveis, entre 32 e 62 anos. Os investigadores confirmaram que um maior Índice de Massa Corporal estava associado a piores desempenhos cognitivos. Este artigo foi referido pelo Diário de Notícias.

    "Physical fitness and lifetime cognitive change"
    Investigação para testar a hipótese da boa condição física estar associada a um melhor envelhecimento cognitivo. Testadas 460 pessoas que tinham participado no Scottish Mental Survey de 1932. Provada associação positiva. Um QI mais elevado na infância também está associado com melhor desempenho pulmonar na idade avançada.
  • terça-feira, outubro 10, 2006

    Neuro-estética

         «Muita gente está a começar a interessar-se pelo campo emergente da neuro-estética — a tentativa de usar a neuro-ciência para compreender a arte e o comportamento estético.
    [...]
         «A neuro-estética pode ser concebida como fazendo parte de um estudo mais geral da arte e da estética como fenómeno biológico. Sigo outros proponentes neste campo (como Tecumseh Fitch) na designação de bio-estética. O objectivo global da bio-estética é a resposta a três questões básicas — o quê?, como?, porquê? — relativamente ao comportamento estético nos humanos: o que é a arte e a estética?; como é que a arte e a estética surgem do cérebro?; e porque é que esta capacidade cognitiva se desenvolveu nos humanos? A neuro-estética está predominantemente preocupada com a segunda questão.»
    [...]

    Martinskov no blogue BRAINETHICS

    Memorização

    “Neurónios musculados, precisam-se!”…
    Texto de Salvador Massano Cardoso no blogue 4R - Quarta República

     «Tenho seguido com muita atenção o trabalho e a investigação de um notável cientista português, o professor Castro Caldas. O neurocientista revela-nos, graças às novas tecnologias, como funcionam os cérebros dos analfabetos e os que aprenderam a ler em criança. As diferenças são abismais, provando que a melhor aprendizagem deverá ocorrer em momentos certos acompanhando o desenvolvimento cerebral. Agora, e a propósito de um livro sobre o "Desastre no Ensino da Matemática: como recuperar o tempo perdido", foi noticiado que o professor Castro Caldas defende que "o treino da memorização não é uma actividade menor". Depreende-se que o treino da memória é indispensável ao desenvolvimento cognitivo e que se acompanha de um aumento dos neurónios e respectivas ligações. Assim, a velha técnica de “aprender de cor” a tabuada é muito positiva. A notícia não me surpreendeu pelo facto de acompanhar a obra do colega, mas desencadeou uma velha recordação. [...]
          «As técnicas de memorização estendiam-se a muitas outras actividades. Ainda hoje, e não obstante o tempo já passado, ainda recordo muitas coisas aprendidas com esta técnica. Espero que tenha estimulado a produção de muitos neurónios e sobretudo muitas conexões neuronais, porque com a idade muitos vão à vida, e para sobrevivermos no mundo cada vez complexo e competitivo que nos cerca bem precisamos de neurónios bem musculados, caso contrário...»

    Comentário:
         A analogia do cérebro com um músculo faz sentido, mas pode igualmente ser limitativa.
         É sabido que partes do corpo humano que não são usadas tendem a degradar-se e a estiolar, de acordo com uma lógica de economia de meios: se determinado órgão não é utilizado, será um desperdício estar a canalizar energia e outros recursos para a respectiva manutenção e funcionamento optimizado.
         Mas a "ginasticação" do cérebro — com o significado de 'uso regular para fortalecimento' — tem outras consequências que a metáfora do trabalho muscular não esclarece. Por exemplo: a aprendizagem matemática, nomeadamente de funções complexas, parece ter efeitos positivos em outras funções cerebrais, tais como a resolução de problemas do dia a dia, ou de organização profissional. Isto talvez aconteça devido à utilização dos mesmos circuitos e funções cerebrais para tarefas de natureza diversa — o que não é incompatível com a topografia fraccionada do funcionamento cerebral, em que uma dada tarefa recorre a diferentes zonas e funções cerebrais.
         É provável que as dificuldades, observadas por docentes em muitos dos seus alunos, no desenvolvimento de raciocínio crítico (usar uma ferramenta teórica para solucionar um problema diferente daquele em que foi inicialmente demonstrada, ou reconhecer uma questão que foi aprendida, quando a mesma surge sob um ponto de vista ligeiramente diferente) tenham a ver com a simplificação das exigências lectivas na matemática durante o percurso escolar anterior.
         Pode existir aqui um paradoxo cruel: ao dirigir o ensino para uma aprendizagem supostamente mais "humanizada", apoiada no "aprender por si" e com desvalorização dos processos de memorização [veja-se esta entrevista de Nuno Crato] a geração soixante-huitard pode ter provocado o efeito oposto ao pretendido, degradando a produtividade da aprendizagem.

    quarta-feira, agosto 30, 2006

    Sistema dopaminérgico

    "Neural Differentiation of Expected Reward and Risk in Human Subcortical Structures"
    Kerstin Preuschoff, Peter Bossaerts e Steven R. Quartz
    "Neuron", Vol 51, 381-390, 3.Agosto.2006

    «Na tomada de decisão em situação de incerteza, os estudos económicos enfatizam a importância do risco, adicionalmente ao ganho esperado. Os estudos de neurociência concentram-se mais no ganho esperado e na aprendizagem do que no risco. Nós combinámos o recurso à imagiologia funcional com um jogo simples para fazer variar o ganho esperado e o risco simultaneamente, mas de modo não correlacionado. Apoiando-nos na teoria da decisão financeira, modelámos o ganho esperado como a expectativa matemática do ganho, e o risco como a variância do ganho. A activação das estruturas dopaminocetivas relacionou-se com ambos os parâmetros matemáticos. Estas activações diferenciaram-se espacialmente e temporalmente. Temporalmente, a activação relacionada com o ganho esperado foi imediata, enquanto que a activação relacionada com o risco ocorreu com atraso. (...) Estes resultados sugerem que a tarefa primária dos sistema dopaminérgico é conduzir os sinais dos ganhos estocásticos, tais como o ganho e risco esperados, para além do seu papel na aprendizagem, motivação e projecção [salience].»


    "Can anticipatory feelings explain anomalous choices of information sources?"
    Kfir Eliaza e Ran Spieglerb, "Games and Economic Behavior"
    Volume 56, Issue 1 , Julho 2006, Pp. 87-104
    «O bem-estar dos agentes é frequentemente e directamente afectado pelas suas crenças, na forma de antecipação de sentimentos tais como ansiedade e expectativa. Os economistas têm tentado modelar este efeito introduzindo as crenças como argumentos na função de utilidade von Neumann-Morgenstern (vNM) dos formadores de decisão. Pode-se esperar que um tal modelo seja capaz de explicar atitudes anómalas relativamente à informação que observamos na realidade. Mostramos que o modelo possui várias limitações quanto a este aspecto, desde que a actualização Bayesiana seja mantida.»

    Metodologia

    "Method Matters: An Empirical Study of Impact in Cognitive Neuroscience"
    Artigo de Lesley K. Fellows e outros, publicado no Journal of Cognitive Neuroscience (vol. 17, nº 6 - Junho 2005).

    Análise de literatura publicada sobre neurociência cognitiva, comparando o recurso ao estudo de lesões e à imagiologia funcional. Os investigadores admitem que o recurso ao estudo de lesões ainda conrinuará a ser importante, apesar desta técnica manifestar alguma diminuição relativamente à imagiologia funcional.

    quinta-feira, agosto 24, 2006

    Teoria económica


    «Ao longo do passado meio século os economistas responderam ao desafio que Allais [1], Ellsberg [2] e outros levantaram ao neoclassissismo, quer estabelecendo fronteiras à teoria económica, quer optando por abordagens descritivas. Embora ambas estas estratégias se tenham revelado muito frutíferas, nenhuma forneceu uma clara abordagem programática que aspire a uma completa compreensão do processo de decisão humana, tal como fez o neoclassissismo. Existe, contudo, crescente evidência de que os economistas e os neurobiólogos estão agora a revelar os mecanismos físicos pelos quais a neuro-arquitectura realiza a tomada de decisão. Embora ainda na sua infância, estes estudos sugerem quer uma moldura unificada para compreender a tomada de decisão pelos humanos, quer quer uma metodologia para contenção do âmbito e da da estrutura da teoria económica. De facto, existe já evidência de que estes estudos colocam constrangimentos matemáticos aos modelos económicos existentes. Este artigo faz a revisão de alguns desses constrangimentos e sugere o âmbito de uma teoria neuroeconómica da decisão.»

    "Physiological utility theory and the neuroeconomics of choice"
    artigo de Paul W. Glimcher, Michael C. Dorris e Hannah M. Bayer
    Games and Economic Behavior, Agosto de 2005

    [1] Allais M., "Le comportement de l’homme rationnel devant le risque, critique des postulats et axiomes de l’ecole americaine". Econometrica. 1953;21:53–526.
    [2] Ellsberg D., "Risk, ambiguity, and the savage axioms". Quart J Econ. 1961;75:643–669

    terça-feira, agosto 15, 2006

    Decisões, Incerteza e o Cérebro

    «[...] As aranhas e as formigas estão longe de ser mestres da matemática ou magos das probabilidades (e eu temo que aconteça o mesmo com muitos membros da Confraria dos humanos, mas não vou agora desenvolver esse ponto.) No entanto, elas comportam-se tal como os modelos económicos da satisfação [satisficing] tipicamente predizem. Elas fazem-no na procura de comida, de acasalamento, de segurança do lugar para descansar, e por aí fora. Resumidamente, a modelação económica mostra que criaturas muito estúpidas podem fazer coisas muito espertas, não pensando nelas coisas tal como faria um teórico da decisão, mas precisamente como resultado de milhões de anos de estratégias ao acaso que levaram algumas espécies a adquirir uma boa probabilidade de ficar por cá, pelo menos durante mais uma geração - supondo que o mundo se mantém mais ou menos estável durante a existência dessa geração.

    «Os neurónios do cérebro também são, cada um deles, bastante estúpidos. Mas séculos de evolução conduziram-nos a respostas probabilísticas para que, em conjunto, criem estratégias para manter todo o organismo intacto durante mais uma geração (continuando a supor que o mundo se mantém mais ou menos estável durante a esse tempo). Para Glimcher, os modelos econométricos são tão precisos como qualquer coisa que se possa imaginar para mostrar que biliões de neurónios estúpidos podem agir em conjunto para aumentar a probabilidade de que o sistema - o animal - utilize avisadamente os seus recursos para garantir a sua permanência no mundo durante mais algum tempo.»

    Recensão de Paul A. Wagner ao livro
    "Decisions, Uncertainty, and the Brain:
    The Science of Neuroeconomics
    "
    de Paul W. Glimcher
    MIT Press, 2003.

    Diferenças individuais

    "Identifying Individual Differences: An Algorithm With Application to Phineas Gage
    artigo de Houser, Daniel, Antoine Bechara, Michael Keane, Kevin McCabe, e Vernon Smith
    in Games and Economic Behavior.

    Um dilema

    "Risk Preference Instability Across Institutions: A Dilemma", de Berg, Joyce, John Dickhaut e Kevin McCabe
    Proceedings of the National Academy of Sciences

    Neuroeconomia

    «A Neuroeconomia é o estudo de como o cérebro interage com o ambiente externo para gerar comportamento económico. A investigação neste campo proporcionará aos cientisas sociais uma melhor compreensão do processo de tomada de decisão dos indivíduos para melhor prever o comportamento económico.»

    In Neuroeconomics (pdf) artigo de Kevin McCabe,
    da George Mason University (EUA)
    na Encyclopedia of Cognitive Science

    domingo, agosto 06, 2006

    Ganhos e Perdas

    Uma equipa de cientistas do California Institute of Technology, de Pasadena, realizou experiências com humanos em jogos simulados que mostraram que perante a avaliação de uma situação envolvendo probabilidades de ganhos e de perdas, as pessoas se concentram primeiro, durante um curto lapso de tempo, nos ganhos, e só depois no risco de perdas. Esta descoberta foi possível pelo recurso às técnicas de imagiologia, dado que a avaliação de ganhos e de perdas se processa em diferentes zonas do cérebro.

    Os resultados deverão ser publicados na edição de Agosto da revista Neuron. Notícia no MSN Health & Fitness.

    terça-feira, abril 11, 2006

    «A Ciência e a Matemática não formam cidadãos. Só a Arte o pode fazer. A conclusão é de António Damásio, que refere haver cada vez mais uma distância entre as facetas cognitivas e as emotivas. As afirmações do investigador foram proferidas na sua intevenção na Conferência Mundial sobre Educação Artística, que decorreu no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, entre 6 e 9 de Março de 2006. O afastamento deve-se, na sua opinião, à ênfase dada a disciplinas como Ciência e Matemática em prol do desleixo para com a Arte. Se a educação mantiver este desequilíbrio, "irá piorar as relações sociais e a criatividade", alerta o investigador, e adianta que "as emoções funcionam como classificadores de acções e ideias. Sem elas servindo essa função, viveremos em pura racionalidade. Este afastamento do cógito à emoção pode levar-nos a indivíduos sem moral".

    Damásio salienta também a importância da Educação Artística no desenvolvimento da Economia, baseada em inovação e criatividade - capacidades que as artes desenvolvem.»

    "Pontos nos ii"
    nº 4, Abril de 2006

    Comportamentos


    "Sanguessugas? Não te preocupes. Um bocadinho de sangue a menos não te vai fazer falta."


    "Statistics of Decision Making in the Leech"
    Journal of Neuroscience, Março de 2005

    Elizabeth Garcia-Perez, Alberto Mazzoni, Davide Zoccolan, Hugh P. C. Robinson, e Vincent Torre
    «Os animais optam continuamente entre diferentes comportamentos, mas, mesmo nos invertebrados, os mecanismos subjacentes à sua escolha e decisão são desconhecidos. Neste artigo, o comportamento espontâneo de sanguessugas foi observado e quantificado durante 12 horas. Obtivemos uma caraterização estatística, nos domínios do espaço e tempo, dos processos de decisão subjacentes à selecção do comportamento. Descobrimos que a distribuição espacial da posição das sanguessugas, num ambiente uniforme, é isotrópico (o mesmo em todas as direcções), mas esta isotropia é quebrada pela presença de estímulos externos localizados. No domínio temporal, as transições entre comportamentos podem ser descritas por um processo de Markov, cuja estrutura (estados e transições admitidas) é altamente conservada entre indivíduos. Finalmente, uma larga gama de padrões recorrentes, determinísticos, foram identificados no comportamento exploratório aparentemente irregular e não-estruturado. Estes resultados fornecem uma rigorosa descrição da dinâmica interna que controla o espontâneo e contínuo fluxo de decisões comportamentais nas sanguessugas.»


    Nota: os links para a Wikipédia foram acrescentados pelo Neuroeconomia, não constando do paper.