Autoscopia
As "experiências sensoriais extra-corpóreas" constituem em fenómeno muito referido nos domínios da "parapsicologia" e outras pseudo-ciências. Trata-se de casos em que as pessoas sentem que "abandonam" o seu próprio corpo e o observam de fora. Muitos dos casos referidos provêm de pessoas que estiveram (ou acreditaram estar) quase a morrer. Mas também existem muitos casos relatados por pessoas que estavam sob o efeito de drogas alucinogénias. Creio que são estas as situações "retratadas" pelo cantor e compositor pop Paul Simon nestes versos do refrão de "American Tune":
And I dreamed I was dying I dreamed that my soul rose unexpectedly And looking back down at me Smiled reassuringly And I dreamed I was flying. |
Em qualquer dos casos (proximidade apercebida da morte ou estados alterados pelo consumo de drogas) a excepcionalidade das situações deveria ser suficiente para se suspeitar de que se trata de um mero fenómeno corpóreo, e não da "revelação" de uma realidade oculta.
Este tipo de estados, ou "ilusões", foram agora provocados em ambiente laboratorial controlado por investigadores suecos e ingleses, sob a orientação de Henrik Ehrsson. Os voluntários sentaram-se numa cadeira usando um par de óculos 3-D ligados a duas câmaras de vídeo colocadas lado-a-lado (para simular a visão estereoscópica) a dois metros de distância das costas do participante. Visionando as imagens captadas pelas câmaras, a pessoa podia ver as suas costas sob a perspectiva de alguém sentado lá atrás. Simultaneamente, o investigador tocava, com uma pequena vara, no corpo da pessoa e/ou no “corpo ilusório” apresentado nas imagens.
Num questionário preenchido posteriormente pelos participantes alguns admitem ter tido a noção de que se estavam a observar a si mesmos de fora dos seus corpos, tal como sentiram que seu corpo real tinha sido tocado, mesmo nos casos em que isso só tinha acontecido na imagem virtual.
Henrik Ehrsson coloca a hipótese de que "a ilusão é causada pela percepção visual dos voluntários em combinação e relacionada com a informação visual e táctil do corpo”.
A nossa noção habitual é que que "estamos" dentro do nosso próprio corpo — as teses de António Damásio desenvolvem precisamente o contributo dos estados sensoriais externos e internos para noção do "eu" ("a consciência de si"). Ora, nestas experiências de Henrik Ehrsson, predomina a noção de que o "eu" está localizado atrás dos olhos; ou melhor, o "eu" é aquele que "vê".
Evidentemente, o nosso corpo não só "vê" como sente simultaneamente outros "inputs" sensoriais (externos e internos); o que esta experiência faz é perturbar artificalmente esta unidade sensorial, fazendo crer (através dos óculos de video) ao observador que está a observar o seu próprio corpo duma posição afastada. Perante "inputs" contraditórios, a cobaia tem de decidir quais deles são verdadeiros. Numa lógica puramente racional, e porque a cobaia sabe que está a receber imagens artificiais, deveria desvalorizar esta informação; mas a valorização e organização das sensações não parece obedecer ao limitado mecanismo da análise racional.
2 Comments:
Um blog excelente! Os meus sinceros parabéns!
A divulgação científica é cada vez mais importante.
Gostei imenso e se me permite, gostaria de deixar ficar o seu link no meu blog ainda incipiente. :)
Obrigado. Agradeço também a "ligação", e parabéns pelos seus blogs.
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